Dia Mundial das Comunicações: Dia para comemoração e reflexão

Um dos frutos do Concílio Vaticano II foi o Dia Mundial das Comunicações. O decreto conciliar Inter Mirifica, promulgado em 4 de dezembro de 1963, é todo dedicado à relação da Igreja com os meios de comunicação. E, por meio deste decreto, foi determinado um dia para que os fiéis reflitam sobre a utilização dos meios de comunicação. Esse dia é celebrado anualmente na solenidade da Ascensão do Senhor (solenidade móvel, conforme o dia da Páscoa).Anualmente, para iluminar as reflexões neste dia, os papas, de Paulo VI a Francisco, publicam uma mensagem especial que é divulgada sempre no dia 24 de janeiro, memória de São Francisco de Sales, padroeiro dos jornalistas. As mensagens publicadas pelos papas são momentos para reflexão e para atualização de temas contemporâneos à luz da Palavra de Deus. As últimas mensagens do papa Francisco tiveram como tema as redes sociais e as fake news.Em 2020, o dia das Comunicações se reveste de um caráter especial. Devemos refletir sobre a mensagem do papa para o ano; e qual o papel dos canais/veículos/meios de comunicação para a vivência e preservação da prática religiosa.
A mensagem do papa Francisco
Para este ano, o papa elegeu como tema de reflexão a importância da narrativa para a vida do homem. "Para que possas contar e fixar na memória (Ex 10, 2). A vida faz-se história". A mensagem reflete sobre a importância da história para a vida e constituição social do homem.Desde a pré-história, o homem contava história para si e seus descendentes por meio das pinturas rupestres. O fascínio pela leitura se dá, sobretudo, por meio das histórias romanceadas que foram escritas ao longo dos séculos. Nos meios audiovisuais, os principais gêneros são aqueles relacionados à narrativa de histórias ficcionais. "O homem é um ente narrador" (Francisco).Em um segundo momento, o papa reflete sobre a Sagrada Escritura: "a história das histórias". Na Bíblia é possível encontrar histórias de virtudes, povos e, sobretudo, a história de Deus que se apresenta como narrador, como personagem e como criador. O título da mensagem é retirado do livro do Êxodo, uma narrativa que já rendeu um filme (clássico) e desenho animado. É a narrativa da intervenção de Deus na história de seu povo.Os quatro Evangelhos de Jesus são narrativas de sua vida. E dentro desses, o meio privilegiado por Ele para ensinar os seus foi a parábola, que nada mais é do que uma história, com enredo e personagens, que, ao final, transmite uma mensagem. E a mensagem que a história de Cristo nos apresenta não é um 'patrimônio do passado': ela se atualiza e se renova a cada leitura que fazemos da Bíblia.O papa nos alerta que não devemos seguir a lógica do storytelling: um recurso amplamente utilizado na publicidade, que consiste na capacidade de contar histórias de maneira relevante, onde os recursos audiovisuais são utilizados juntamente com as palavras. As histórias que criamos não devem ter apenas o caráter comercial, seguir a lógica opressiva do mercado. Uma boa narrativa deve "fazer memória daquilo que somos aos olhos de Deus, testemunhar aquilo que o Espírito escreve nos corações, revelar a cada um que a sua história contém maravilhas estupendas."
A igreja em tempos de isolamento social
O tempo que estamos vivenciando é único no decurso do século. Para se evitar a transmissão de um vírus, autoridades sanitárias recomendaram (e alguns governos decretaram) o isolamento social. É redundante mencionar que tal posicionamento foi surpresa para muitos. Fato é que vários segmentos da sociedade estão tentando se reinventar a fim de se adaptar à situação.Esse isolamento social obrigou a Igreja Católica a rever suas práticas religiosas, com a suspensão do culto em todas as igrejas. É um fenômeno que aconteceu não só no Brasil, mas em nível mundial. O nosso corpo é templo do Espírito Santo (1Cor 6, 19) e, como tal, devemos preservá-lo e zelar pela preservação dos demais 'templos' (meu próximo). Não seria cristão os templos permanecerem abertos facilitando a disseminação do COVID-19.Rapidamente as equipes de PASCOM das paróquias se mobilizaram para, em certa medida, proporcionar aos fiéis o permanente contato com o padre: por meio da transmissão de orações ou das missas.Etimologicamente, a palavra igreja tem sua origem no grego "ekklesia"; o latim absorveu o termo, transformando-o em "ecclesia". Tanto no latim como no grego, o significado do termo é assembleia. Com a ajuda dos meios eletrônicos essa igreja ainda se mantém reunida? Outro conceito interessante para refletir é o conceito de virtualidade. Virtual é aquilo que existe potencialmente e não em ação; suscetível de se realizar ou de se exercer; que é feito ou simulado com auxílio dos meios eletrônicos. Ou seja, o virtual é a experimentação de algo antes que seja configurado como real. Que tipo de igreja, ou ainda, que tipo de prática religiosa emerge nessa época da 'Igreja Virtual'?Uma das possibilidades que deve ser explorada nesse período é a "Igreja Doméstica", em que a diocese da Campanha tem investido. Esse conceito foi amplamente divulgado na Igreja do Brasil a partir da virada do século, com o projeto SINM - Ser Igreja no Novo Milênio. Igreja Doméstica é a igreja que acontece nos pequenos grupos de família, nos setores missionários, na reza do terço... é uma indicação de Paulo no livro dos Atos dos Apóstolos e que, na atual situação, potencializa-se. É importante dizer que nada substitui a Eucaristia, nem o encontro presencial que este sacramento proporciona. Conforme define o documento Sacrosanctum Concilium , a Eucaristia é a fonte e ápice de toda vida cristã. Seu papel é tão essencial na vida do cristão, que o nosso pastor, Dom Pedro Cunha, em seu decreto sobre as instruções pastorais para o tempo de pandemia, dispensou, obedecendo às prerrogativas do Direito Canônico, do preceito da comunhão dominical. E é sempre bom lembrar o versículo norteador do projeto SINM, muito propício para esse tempo de pandemia: "Perseveravam eles na doutrina dos apóstolos, na reunião em comum, na fração do pão e nas orações" (At 2, 42)Na mensagem para o dia das Comunicações do ano passado, Francisco já abordava a questão da presença da internet e das redes nas diversas práticas sociais: "A imagem do corpo e dos membros recorda-nos que o uso da social web é complementar do encontro em carne e osso, vivido através do corpo, do coração, dos olhos, da contemplação, da respiração do outro [...] Se uma família utiliza a rede para estar mais conectada, para depois se encontrar à mesa e olhar-se olhos nos olhos, então [a rede] é um [bom] recurso [...]. Se a rede é uma oportunidade para me aproximar de casos e experiências de bondade ou de sofrimento distantes fisicamente de mim, para rezar juntos e, juntos, buscar o bem na descoberta daquilo que nos une, então é um recurso [positivo]"É um tempo jamais visto na história. "O mesmo Deus e Senhor hoje passa aqui, a nossa história também quer tocar" - já diz a canção. E as novas práticas religiosas, nos fazem vivenciar a fé de outra maneira. Devemos aproveitar aquilo que nos é oferecido e nos manter unidos e perseverantes."Ó Maria, mulher e mãe, Vós tecestes no seio a Palavra divina, Vós narrastes com a vossa vida as magníficas obras de Deus. Ouvi as nossas histórias, guardai-as no vosso coração e fazei vossas também as histórias que ninguém quer escutar. Ensinai-nos a reconhecer o fio bom que guia a história. Olhai o cúmulo de nós em que se emaranhou a nossa vida, paralisando a nossa memória. Pelas vossas mãos delicadas, todos os nós podem ser desatados. Mulher do Espírito, Mãe da confiança, inspirai-nos também a nós. Ajudai-nos a construir histórias de paz, histórias de futuro. E indicai-nos o caminho para as percorrermos juntos." (Papa Francisco)
